domingo, 27 de março de 2016

Dona

Foi-se embora todo lamaçal.
Então, pousou todo Seu peso - familiar
Na terra limpa
Boca torta, olho miúdo
Cacoetes
Índia velha, velha
Se riu do "fecha as pernas"
Mas silenciou na sua sabedoria
Ausência das palavras físicas.
Carregou minhas pernas e pôs-se  acomodada no seu trono humilde de palha
Tomou o corpo inteiro
Depois pendeu à direita
Eu, em seu colo-metade esquerda
E com suas mãos cheias de tremedeira, rugas sanguíneas e energia mais que vitais
Me falou, e dessa vez com clareza
Palavras que os homens não poderiam compreender jamais.
Me fez chorar de alegria e risada
Quando a reconheci, entendendo o que dizia
"Us omi não intendi é nada dos nosso segredo, menina"
E gargalhávamos juntas, sem parar, na sua brincadeira,
Em nossa intimidade indescritível.
Mostrou tanta coisa mais linda que a outra
Sobre as profundezas verdes, roxas, noturnas, diurnas e brilhantes
Do sagrado feminino
Varreu inseguranças e invejas
Explicou sobre a singularidade
Mostrou-me no útero da minha mãe
Mostrou-me a delícia e o empoderamento do sexo como nunca havia visto
Mostrou minhas mulheres externas e internas
Mostrou seus mistérios como respostas e perguntas
"Eu vim dum tempo que passado e futuro se confundem
Dum lugar donde eu e tu somos uma só
I todas mulher é uma
Cada qual com seus véus e luas
Elas, ouça e ame"
Elas também eram montanhas e brisas
Folhas e naturezas e fêmeas
Tetas tão cheias quanto nossa força criadora
E o silêncio da sabedoria
A observação
A canseira da idade avançada
Tudo isso e muito mais mostrou-me essa que era
Quem?
Minha mestra?
Minha ancestral? Minha entidade? Minha idade futura?
Eu? Ou outra?
Ora uma, ora ambas, ora todas,
Sempre unidas em um só corpo,
E foi-se de repente
Sem dar sinal.
Sua despedida foi quando já era Vento
Brincou com meus cabelos, acariciou minhas costas no sol,
Dançou comigo,
Me encheu o pescoço de beijos, com fofura,
Deu uns cheiros,
Ninou-me,
Presenteou-me com canções e fez-me olhar para a singeleza do chão de grama
E toda a vida que continha.
Espalhou-se no ar.
Foi-se.
Mas permaneceu.

Eu
Não
Ando
Só.

Salve Ayahuasca! 27/03/2016 <3

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